Adormecida - Castro Alves

10/01/2011 15:47

 

Adormecida

 

 Uma noite eu me lembro... Ela dormia

    Numa rede encostada molemente...

    Quase aberto o roupão... solto o cabelo

    E o pé descalço do tapete rente.

 

'Stava aberta a janela. Um cheiro agreste

    Exalavam as silvas da campina...

    E ao longe, num pedaço do horizonte

    Via-se a noite plácida e divina.

 

De um jasmineiro os galhos encurvados,

    Indiscretos entravam pela sala,

    E de leve oscilando ao tom das auras

    Iam na face trêmulos — beijá-la.

 

Era um quadro celeste!... A cada afago

    Mesmo em sonhos a moça estremecia...

    Quando ela serenava... a flor beijava-a...

    Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia...

 

Dir-se-ia que naquele doce instante

    Brincavam duas cândidas crianças...

    A brisa, que agitava as folhas verdes,

    Fazia-lhe ondear as negras tranças!

E o ramo ora chegava, ora afastava-se...

    Mas quando a via despeitada a meio,

    P'ra não zangá-la... sacudia alegre

    Uma chuva de pétalas no seio...

Eu, fitando esta cena, repetia

    Naquela noite lânguida e sentida:

    "Ó flor! — tu és a virgem das campinas!

    "Virgem! tu és a flor da minha vida!..."

 

Poeta Castro Alves